A construção de buyer personas não é uma atividade tão rasteira quanto muitas empresas às vezes são orientadas a fazer por blogs e ebooks. Ela envolve um trabalho intenso de investigar o comportamento de compra do público com entrevistas com clientes atuais.
André Iunes, da agência iunes.me, trouxe à edição #146 do Podcast-se seu case de construção de personas. Você pode ouvi-lo abaixo — ou via Spotify. Ou ler a transcrição a seguir.
Cassio Politi: Você tem um case legal justamente de buyer personas. Eu queria que você contasse como foi esse case.
André Iunes: Em 2017, fomos convidados a fazer o site de uma grande associação médica de medição do trabalho, que tem mais de 5 mil associados. Essa associação já tinha um site no ar. O primeiro passo foi fazer uma análise do site atual para ver o que funcionava e o que não funcionava. Propusemos para o cliente o trabalho de buyer personas para conhecermos a fundo o associado, que é o médico do trabalho. Queríamos entender seus dramas, seus pain points. Entrevistamos 27 médicos do trabalho do Brasil inteiro, e isso resultou em 9 horas de conversa. Ao final desse processo, um relatório muito detalhado, de aproximadamente 40 páginas, com muita informação valiosa, foi o fruto dessas entrevistas. No final, saíram quatro personas. Primeiramente, levantamos várias hipóteses com a diretoria da associação, perguntando coisas do cotidiano do médico do trabalho. Depois, confirmamos as hipóteses entrevistando os médicos. Uma coisa muito importante que aprendemos é que, quando você faz a persona, realmente entrevista e entra na cabeça do público-alvo, você passa a ter um domínio muito maior do projeto. Você passa até mesmo a dialogar com o seu cliente quase de igual para igual. Porque, às vezes, você está numa reunião e o cliente diz: “acho que não é por esse caminho”. Você responde: “não é por esse caminho também, mas é por esse outro. Olha o nosso relatório, a nossa conversa, o que o seu público-alvo sente sobre determinado assunto”.
Como vocês conduziram as entrevistas. Vocês roteirizaram as perguntas?
Nós estávamos muito preocupados em não tendenciar as respostas. E também não queríamos contaminar as pessoas com algum tipo de opinião sobre a associação em si. Levantamos junto à associação alguns contatos e, partir daí, trabalhamos de forma sequencial. Todas as entrevistas foram por telefone. Numa entrevista de persona, é muito importante que a sua cabeça esteja atenta aos insights. Você pega um fio e conduz para uma outra conversa específica e vai buscar outros pontos de vista sobre o que você quer realmente descobrir. Nós não roteirizamos nada. Começamos por uma pergunta básica e, a partir da resposta, conduzimos para outras perguntas específicas. Logicamente, quando queríamos buscar uma determinada opinião sobre um assunto que seria importante, colocávamos aquele tópico no nosso radar. Ao final de cada conversa, pedíamos o contato de uma outra pessoa. Nesse processo, nos afastamos um pouco do entrevistado com relação estreita com a associação. Queríamos também pessoas de mais longe, com as quais pudéssemos pegar a essência da profissão. Falamos, então, muito sobre os dramas da profissão, o que eles queriam em termos de valorização da profissão deles. Quando começamos a perceber um padrão de resposta, concluímos que chegamos a um comportamento. O bacana da persona é que, às vezes, a primeira conversa que você tem é diferente da última. São entrevistas diferentes, que apontam para lugares diferentes. Mas a última conversa que você tem acaba sendo uma conversa mais madura do que as entrevistas do começo.
Quer dizer que, quando você começou a saber quais são as respostas que esses médicos iriam dar, você teve a sensação que você tinha descoberto quem era a persona. Mais ou menos isso?
É mais ou menos isso, sim. Uma coisa muito legal é que, às vezes, você só entrega para o cliente a persona em si, o arquétipo. Do tipo: “olha, você tem de escrever ou fazer um produto para essa pessoa”. Mas o volume de informação que você extrai dessas entrevistas gera um relatório. Tudo que está escrito neste relatório não é a minha opinião, é a opinião do público. A partir do momento em que você identifica os pontos de melhoria por meio do que as pessoas falam nas entrevistas, você pode propor suas estratégias para o site. No caso da associação, entregamos quatro perfis, sendo dois médicos jovens e dois médicos de meia idade. O relatório foi muito detalhado, propondo um plano de ação para poder aliviar os pontos de dor dos públicos-alvo. Foi um trabalho tão aprofundado que a própria presidente da associação fez um post no site dizendo que ela tinha movimentando toda a diretoria da associação para poder sanar esses pontos dolorosos. Muito do que a gente identificou eram coisas que extrapolavam a comunicação. Por exemplo, o que fazia com que o médico não se associasse não era o custo de adesão, e sim a baixa percepção de retorno que a associação dava. Nós propusemos não só parcelar e rever o preço da anuidade, mas também criar ações que levassem o médico a perceber as vantagens de poder participar de eventos, por exemplo.
Vocês fizeram quatro personas. Que critério você usou para definir que eram quatro personas, e não cinco, seis ou sete?
Na verdade, a associação tem dois públicos específicos que ela quer atingir. Um público é o jovem, recém-formado, que está saindo da faculdade de medicina agora. Ela quer pegar esse público e ser um braço direito dele para tocar a carreira com segurança. O outro público é o de meia idade, de uns cinquenta e poucos anos, que já é sócio mas não pode deixar a associação. Definimos esses dois recortes. No caso do profissional de meia idade, queríamos descobrir o que fazer para segurá-lo na associação. Dos jovens, queríamos entender quais eram os desejos, dificuldades e medos. Estruturamos a persona em alguns tópicos. No primeiro, criamos um nome fictício, formação, atuação e idade. A partir daí, elencamos por tópico o que ele procura, os pain points, os desejos, o que esse médico procura na profissão e como a associação pode abastecê-lo, ampará-lo. No segundo tópico, listamos o que pesa na decisão de compra do médico — ou seja, na decisão de se tornar associado —, destacando o que ele valoriza como critério de compra, que tipo de retorno quer ter. E também os gatilhos: o que desperta o desejo de compra nesse associado? É uma vantagem muito grande? É um valor ou uma promoção que a associação possa dar? Um pacote exclusivo? Esses foram os pilares dessas personas.